Buscar

Me senti enganado, diz juiz que manteve menino com o pai no RS

Corpo da criança de 11 anos foi encontrado em mato no Norte do estado.Pai, madrasta e amiga são suspeitos do crime e estão presos, diz polícia.

(Foto: Cristiane Luza/Jornal Folha do Noroeste)

A prisão do médico cirurgião Leandro Boldrini sob suspeita de participar da morte do filho Bernardo Uglione Boldrini abalou o juiz Fernando Vieira dos Santos, 34 anos, da Vara da Infância e Juventude de Três Passos, no Noroeste do Rio Grande do Sul. Foi o magistrado quem autorizou no inicío deste ano que o garoto continuasse morando com o pai, após o Ministério Público (MP) instaurar uma investigação contra o homem por negligência afetiva e abandono familiar.

Comovido com o caso, o juiz ressaltou ter tomado a providência padrão ao priorizar a reinserção dos vínculos familiares, como prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Mas reconheceu: jamais imaginou o desfecho trágico. “O Bernardo foi enganado. E eu me senti enganado. Assim como ele eu não sabia que ele estava sendo levado para Frederico Westphalen”, disse o magistrado ao G1.

O menino de 11 anos estava desaparecido desde o dia 4 de abril. O corpo dele foi encontrado enterrado em um matagal na noite de segunda-feira (14) no interior de Frederico Westphalen, a cerca de 80 quilômetros de Três Passos.

A criança morava com o pai, Leandro Boldrini, e a madrasta, Graciele Ugolini Boldrini. O casal, que tem uma filha de um ano de idade, foi preso preventivamente junto com a amiga Edelvania Wirganovicz por suspeita de participação na morte. Segundo a Polícia Civil, o garoto foi morto com uma injeção letal, o que ainda deverá ser confirmado pela perícia.De acordo com o MP, desde novembro do ano passado o pai de Bernardo era investigado por suspeitas de negligência afetiva. Mas jamais houve indícios de agressões físicas. Em janeiro, o garoto foi ouvido pelo órgão e chegou a pedir para morar com outra família.

No início do ano, o médico pediu uma segunda chance. Com a promessa de que buscaria reatar os laços familiares com o filho, ele convenceu a Justiça a autorizar uma nova experiência. Na época, a avó materna, que mora em Santa Maria, na Região Central, chegou a se oferecer para assumir a guarda. Porém, conforme o MP, Bernardo também concordou em continuar na casa do pai e da madrasta.

“Isso é dito no Estatuto da Criança e do Adolescente. A reinserção dos vínculos familiares é a providência padrão. Não imaginávamos que tivesse esse desfecho. Porque não havia qualquer informação de agressões. Então, tomamos essa decisão baseada nas premissas legais”, enfatizou o juiz.

A decisão do magistrado também teve apoio do MP. Na ocasião, a promotora da Infância e Juventude de Três Passos, Dinamárcia Maciel, entrou em consenso com a Justiça. “Não dá pra trabalhar com o imprevisível. Mas dentro de um bom senso da legalidade, se fez o que faria em qualquer caso”, disse a promotora.

Mesmo sem opinar sobre as conclusões da investigação policial, o juiz disse que ficou emocionado com o caso. “Ficou esse sentimento negativo, de tristeza, de desencanto com a vida e com as pessoas, com a forma a qual as pessoas se relacionam com o mundo. E agora temos que tentar manter rotina. A gente é pai, é ser humano. Não há como ser geladeira. Não me arrependo, mas a gentre reflete sobre o que poderia ter sido feito”, avaliou.Velório comoveu comunidadeApós ser velado em Três Passos, o corpo de Bernardo chegou por volta das 20h a Santa Maria, na Região Central, onde reside a avó materna da família do menino. O enterro está programado para ocorrer às 10h desta quarta (15), no Cemitério Municipal de Santa Maria. O corpo será sepultado ao lado do túmulo da mãe do garoto, morta em 2010. Conforme a polícia, ela cometeu suicídio.

Avó e ex-babá relatam maus-tratosAvó materna do menino de 11 anos, a aposentada Jussara Uglione, 73 anos, disse nesta terça-feira (15) que a criança era maltratada. Segundo Jussara, o pai de Bernardo e a madrasta não permitiam que ela visitasse o garoto desde que sua filha e mãe da criança, Odelaine, morreu.

“O menino sofria maus-tratos. Ela (madrasta) não deixava ele entrar em casa enquanto o pai não chegasse. O menino ficava sentadinho na calçada. A Justiça sabia disso porque toda a vizinhança via ele sentado na calçada”, disse Jussara.Uma ex-babá do menino também afirmou que o garoto recebia pouca atenção do pai e, principalmente, da madrasta. A mulher trabalhou na casa da família por dois anos. Ela sempre afastava o menino dela. Agredia com palavras, diz Helaine Marisa Wentz, ex-babá do menino.

Amigos da família disseram que Bernardo não tinha outros parentes na cidade. A mãe dele morreu em fevereiro de 2010, aos 30 anos. Segundo a Polícia Civil, a mulher cometeu suicídio com um tiro na cabeça no consultório médico do ex-marido, pai do garoto.

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.