Publicado em 06/02/2018 às 15:07, Atualizado em 06/02/2018 às 17:36

Ação da PF sem mandado judicial pode anular provas colhidas na Lama Asfáltica

Kitnet no indubrasil teria sido alvo de ação mesmo sem mandado judicial

Liziane Berrocal,
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Foto: André de Abreu

Um novo capítulo pode mudar os rumos da Lama Asfáltica em Mato Grosso do Sul. Após a prisão relâmpago do ex-governador André Puccinelli e seu filho André Puccinelli Junior – com direito a puxada de orelhas por parte do desembargador Paulo Fontes que expediu alvará de soltura e questionou a prisão inicialmente negada na Terceira Vara.

Agora, uma suposta “trapalhada” pode anular provas ou mesmo provocar a queda ou atraso do processo.

O motivo seria um suposto erro da própria Polícia Federal que fez busca e apreensão de documentos e objetos sem mandado específico para isso. O caso aconteceu em dezembro do ano passado quando os policiais estiveram em uma quitinete no Indubrasil e levaram de lá documentos e outros materiais ainda não especificados que seriam do ex-governador André Puccinelli.

"Eles estiveram aqui e não mostraram nenhum papel, nenhum mandado", garante seu Luiz, o homem que alugava o local para guardar o que seriam documentos e bugigangas do ex-governador. Havia inclusive uma maquete do polêmico Aquário do Pantanal e agendas da época em que ele era governador.

Segundo ele, a operação aaconteceu depois de agentes à paisana monitorarem durante alguns dias a região. "Ficaram em uma semana rodando com um carro Corola e vendo o movimento. Eu nem sabia o que tinha lá dentro e fui explicar isso. Quando perguntei de papel vieram dois delegados e um deles foi até ríspido comigo, mas a gente vai contra polícia?", reclamou questionando com simplicidade.

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Dono de quitinetes que são alugadas para garantir o sustento dele, que tem 70 anos, seu Luiz também tem um lava-jato e faz pequenos consertos.

"Sou trabalhador, nem conheço quem aluga, mas não posso ter prejuízo. Fui lá e abri a porta, um dos delegados até falou que me daria um presente depois e eu deixei claro que não precisava de uma agulha", continuou contando sobre a operação

O idoso afirmou que a questão está nas mãos de advogados e que não sabe o que foi encontrado no imóvel. "Não deixaram uma lista, nem nada, eu deixei com o advogado para resolver".

Silêncio e medo

No distrito industrial, a presença da Polícia Federal causou burburinho, ainda assim os moradores preferem o silencio ou o anonimato.

"Seu Luiz é gente muito honesta, não precisavam ter feito do jeito que foi" comentou um morador.

"Ninguém nem quer falar disso por aqui. Eu que sou nova no local também prefiro não comentar nada. Mas foi muita polícia, parece que só para assustar", opinou a dona de um pequeno comércio.

Outro lado

A reportagem entrou em contato, via e-mail, com a assessoria de imprensa da Polícia Federal solicitando informações sobre o que foi apreendido no local e se procedia a denúncia de que a busca e apreensão teria sido realizada sem mandado.

A princípio a informação foi de que o superintendente da PF estaria de férias e o adjunto, Cleo Mazzoti, não poderia dar entrevista, pois não teria tempo. As perguntas enviadas não foram respondidas até o fechamento desta reportagem.

Defesa

A defesa do ex-governador André Puccinelli preferiu não se manifestar sobre o assunto. De acordo com o advogado Rene Siufi, o processo ainda está nas mãos do juiz Ney Gustavo Paes de Andrade, juiz substituto da 3 Vara Federal.

A mesma posição foi tomada pelo advogado André Borges, que representa os professores Jodascil Gonçalves e João Paulo Calves, também presos na última fase da operação Lama Asfáltica.

O que pode acontecer?

Segundo especialistas consultados pela reportagem, toda busca e apreensão deve ser feita com o devido mandado judicial. Em caso de descumprimento da lei, há a possibilidade de trancamento do processo até a anulação das provas colhidas na misteriosa quitinete.

Os juristas são cautelosos e preferem não adotar posicionamento sem conhecerem o processo.

"Cada juiz tem um entendimento, mas pode ocorrer desde um HC para trancar o processo, até anular as provas colhidas nesta operação específica. Isso atrasa o processo como um todo, apenas isso", exemplificou o criminalista Leonardo Miranda.

Prisão arbitrária?

O desembargador Paulo Fontes que concedeu habeas corpus liberando Puccinelli da prisão considerou a medida desmedida, já que na ocasião não havia nem denúncia contra ele e fazia tempo que o ex-governador havia deixado o cargo

Segundo Fontes, a medida "havia sido requerida mas denegada pela mesma 3ª Vara Federal de Campo Grande no mês de maio do ano em curso, justamente sob o argumento de que, havendo deixado o cargo em questão já há alguns anos, sua permanência em liberdade não acarretaria riscos à ordem pública", argumentou.

O magistrado ainda desaconselhou novas medidas como a prisão, já que para ele "a falta de conclusão das investigações, apesar do alongado decurso de prazo, desaconselha a decretação de novas medidas cautelares, a não ser que se adequem rigorosamente aos requisitos legais"