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Crianças também podem ser psicopatas: mentiras, agressão e desobediência são sinais da doença 

Primeiros alvos dos portadores da doença são a mãe, irmãos e animais de estimação

Maria tem seis anos e adora se divertir. Entre suas brincadeiras preferidas, estão enfiar agulhas nos animais de estimação da família, e também chutar os genitais do irmão menor. Maria poderia ser apenas uma complexa personagem de um filme ou romance, mas é uma menina de verdade, e que recebeu um diagnóstico de seu psiquiatra: a maldade que permeia os atos que pratica não é algo inerente à infância, mas, sim, uma doença sem cura. Maria é uma pequena psicopata.

Embora as formalidades médicas impeçam que a menina seja chamada desta maneira oficialmente — antes dos 18 anos, denomina-se “transtorno de conduta”, de acordo com a Associação Americana de Psiquiatria —, o fato é que Maria se enquadra na grande maioria dos fatores usados para identificar a doença, sendo o mais marcante deles a ausência de empatia — psicopatas não conseguem se colocar no lugar dos outros e sentir o que eles sentem.

Ao longo de muito tempo, se questionou se é possível mesmo que meninos e meninas nasçam malvados, ou se a crueldade seria invariavelmente fruto do ambiente ou da criação. O neurologista Ricardo de Oliveira Souza é categórico na resposta.

— É claro que é possível. Existem crianças que nascem más, que serão más, e não há nada que possamos fazer para modificar este comportamento. A sociedade é romântica e tem dificuldade em aceitar esta possibilidade. Mas, sinto muito, é assim que funciona.

Para a psicanalista Júlia Bárány, a psicopatia surge desde que o bebê vem ao mundo, como foi o caso de Maria, a garota que desde muito cedo torturava animais e o próprio irmão. No geral, explica a especialista, os primeiros sinais se manifestam junto com o desenvolvimento da interação com as pessoas, e o alvo elementar de uma criança psicopata é quase sempre a própria mãe.

— Ela faz de tudo para irritar a mãe porque tem prazer com isso. Se a criança descobriu que a mãe fica perturbada com alguma coisa específica, ela vai fazer justamente aquilo para provocar. Ela tem todas as reações de uma criança birrenta, mas, neste caso, não é birra, e sim indício de que não há nenhuma conexão com o outro.

Estima-se que haja 69 milhões de psicopatas no mundo, e que as taxas do transtorno variem entre 0,5% a 3%. De acordo com dados do estudo americano The Epidemiology of Antisocial Behavior in Childhood and Adolescence (A Epidemia do Comportamento Antissocial na Infância e na Adolescência, em tradução livre), de 1991, a psicopatia é mais comum em crianças do sexo masculino, independentemente da idade.

Seja em meninos ou meninas, o transtorno é diagnosticado por meio de critérios de uma lista com 15 possibilidades de comportamento, utilizada pelos psiquiatras. Mas, de acordo com Ricardo de Oliveira, mesmo antes do teste definitivo os médicos já acendem o sinal de alerta ao se deparar com dois sintomas muito característicos da psicopatia: a desconsideração por regras e hierarquia, e a agressão física contra os pares.

Sintomas

Crianças psicopatas não reagem a castigos, por exemplo. Cometem os erros, e, mesmo depois de receber uma punição por eles, acabam reincidindo ao repetir a mesma falta, como explica a psicanalista Júlia.

— Ela não aprende o que é certo ou errado. Pode até parar de fazer aquilo, mas só porque não quer o castigo de novo, e não porque entendeu a lição. São crianças que agridem os irmãos. Não têm compaixão, e podem machucar animais de maneira extrema, estraçalhando-os. A criança psicopática mente mesmo quando não precisa. Todas as crianças mentem para escapar da bronca, para não magoar os pais, mas as psicopáticas mentem porque isso faz elas se sentirem dominando o ambiente. Elas não têm nenhum problema em fazer alguma coisa errada, elas não se arrependem, isso não as afeta.

Além do comportamento dentro de casa, Júlia alerta que é preciso que os pais também fiquem atentos à conduta dos filhos na escola.

— Uma criança psicopata pode causar muitos danos. Já ouvi casos extremos como o de uma que colocou uma bomba na secretaria para explodir os documentos, porque não queria que suas notas ruins fossem conhecidas pelos pais.

Claro que nem toda criança levada, seja no ambiente escolar ou em casa, é necessariamente uma criança psicopata, mas o inverso é certo: adultos psicopáticos foram, com toda certeza, garotas ou garotos complicados.

A única situação em que o diagnóstico da psicopatia infantil pode ser duvidoso é em casos de abuso ou maus tratos. Indícios da doença podem, na verdade, ser uma reprodução de experiências vividas previamente pela criança, conforme explica Júlia.

— A criança pode imitar o que fizeram com ela. O psiquiatra tem que ter uma atitude quase como de um detetive, vendo com cuidado o histórico da criança na família, se há casos de maldade camuflada gerando uma criança traumatizada e não psicótica. No entanto, quando os traços psicopáticos aparecem em um ambiente familiar saudável, é preciso ficar de olho.

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